Capital do surfe e de outras ondas
Baía Formosa investe na criação de novos produtos, serviços e roteiros para fortalecer o turismo sustentável, resgatando a história, a cultura e a natureza
O primeiro nome foi o indígena Aretipicaba, “bebedouro dos papagaios”, que aparece ligeiramente modificado na descrição da costa brasileira por Gabriel Soares de Souza, em 1587: “entre um e outro rio está a enseada Aratipicaba, onde os arrecifes para dentro entram naus franceses e fazem a sua carga.” Os rios
são o Curimataú e o Camaratuba.
A carga – lembra Luís da Câmara Cascudo, em Nomes da terra – constava de pau brasil. O livro salienta o fato de que, doze anos antes de fundar-se a cidade de Natal, Baía Formosa já era habitada e centro de produção de pescado. E destaca o surgimento do topônimo definitivo na cartografia portuguesa e holandesa do período colonial: “No mapa de João Teixeira, em 1612, já está Bahia Formosa, denominação dada pelos portugueses enlevados com a beleza da enseada, aberta para o mar na moldura da floresta, depois chamada Mata da Estrela. No mapa holandês de Margrave, 1643, registra-se Guaratapeiuba ou Baya Formosa.
Depois do pau brasil, Baía Formosa virou zona de pesca, notabilizada pelos cardumes de albacoras: de outubro a dezem- bro, abundantes e famosas pelo sabor, elas eram capturadas com a técnica do corso. A praia pa- radisíaca caiu também no gosto dos proprietários de engenhos e fazendas, como os Albuquerque Maranhão, que a utilizavam como local de refrigério no verão. Um deles é personagem do episódio que passou à história como ‘Ma- tança de Agosto’, agora trans- formado em Dia da Resistência. Conta-se que João de Albuquer- que Maranhão, proprietário do engenho Estrela, comandou em 1877 tropa de assalto para ex- pulsar famílias de pescadores arranchados na baía e apropriar- -se das terras do vilarejo. Quinze homens, liderados por Francisco Magalhães, enfrentaram os inva- sores. Seis pessoas morreram no conflito. O comandante da inva- são foi preso, julgado e condena- do, mas não cumpriu pena.
Apesar desse episódio vio- lento, Baía Formosa tem uma história pacífica. Foi distrito de Canguaretama de 1892 até 31 de dezembro de 1958, quando obteve a emancipação política por força da Lei 2.338. A instalação do mu- nicípio ocorreu no dia 17/01/1959. A história local é tema do drama – um gênero teatral que a cida- de havia esquecido, mas que foi resgatado – encenado anual- mente para reviver a saga dos resistentes. O espetáculo ajuda a mover a economia do municí- pio, que recorre ao turismo para incrementar a geração de traba- lho e renda para a população e de receitas para a prefeitura. A encenação do Auto da Resistên- cia incorpora novo elemento – a história – à cadeia tradicional- mente baseada no binômio sol e mar, e que ganha também produ- tos e roteiros criados pela natu- reza ou aproveitados da cultura popular regional. “O turismo tem uma grande relevância, porque movimenta a economia”, explica a prefeita Camila Melo. “Nós temos aqui a usina de cana de açúcar, a prefeitura e a pesca como gran- des empregadores. Mas o turismo é que realmente movimenta a economia da cidade, e, enquanto gestão, nós tentamos movimentar o setor através de eventos durante o ano todo.”
Na alta estação, os pouco mais de 8 mil moradores ganham a companhia de 10 a 15 mil visitantes, aquecendo todo o comércio – e não apenas os setores diretamente ligados ao turismo. Um evento do circuito nacional de surfe traz dezenas de visitantes, irrigando o comércio local com cerca de R$500 mil num fim de semana, calcula a Secretaria de Esportes. O cardápio é farto, variado: eventos esportivos e culturais mesclam-se com festas religiosas e outras manifestações da
cultura popular, preenchendo o calendário durante praticamente o ano inteiro. O município celebra sua história e sua cultura no mês de agosto, com a realização de saraus, dramas, ex- posições, shows e outros eventos nas escolas públicas.
“Todas as sextas-feiras, a gente agrega as escolas ao projeto”, in- forma a secretária de Educação e Cultura, Laís Ferreira dos San- tos Madeiro. “As escolas fazem resgates de Baía Formosa, como, por exemplo, o drama, o pastoril. Cada uma traz a sua programação e desenvolve durante as quatro sextas-feiras, com atrações locais, cantores, grupos musicais, igrejas... Fizemos esse ano, pela primeira vez, o Auto da Resistência. Estamos agora fazendo para o Natal o Auto do Natal, com o mesmo pessoal, focado no nascimento de Jesus.” O investimento em cultura prevê também a reforma de praças para transformação em espaços de criação e difusão da cultura e a implantação de uma sala de cinema, com recursos da lei Paulo Gustavo de fomento ao audiovisual.
CAPITAL DO SURFE
A economia de Baía Formosa estruturou-se em torno da pesca e da produção de açúcar e etanol, tradicionalmente os principais geradores de trabalho e renda no município, como salientou a prefeita. O turismo é uma espécie de terceira onda, favorecida pelo recorte geográfico único no estado, pela exuberância da natureza, a riqueza da história e da cultura e por elementos inesperados, como o campeonato mundial e a medalha olímpica de Ítalo Ferreira, que elevou Baía Formosa, por um dia, a capital mundial do surfe. A cidade liderou o ranking global de buscas na internet, tirando pleno proveito da janela de oportunidades aberta pelo campeão. Após as conquistas, o surfe foi incorporado como elemento de identificação, com presença no conceito e na comunicação visual escolhidos para simbolizar o novo momento: Baía Formosa: cidade do surfe e de todas as ondas. E, por decreto da governadora Fátima Bezerra tornou-se a capital potiguar do esporte.
O vínculo da cidade com o surfe, a fama mundial de suas ondas, os projetos sociais que formam os campeões do futuro atraíram os olhares do país para a Baía dos Golfinhos e os 27 quilôme-
tros de praias que se estendem até a Paraíba. Baía Formosa ga- nhou etapa própria no circuito profissional brasileiro. O Institu- to Ítalo Ferreira e o Projeto Swel oferecem aulas de iniciação ao surfe e oficinas de outras moda- lidades esportivas e profissiona- lizantes. A prefeitura investe nos esportes, sozinha ou em parce- rias com outros entes públicos e com a iniciativa privada, como no caso do projeto Potiguaras. O surfe não é a única opção. As escolas participam direta- mente da formação e da prática esportivas, no contraturno. Equi- pes de atletismo, futebol e vôlei costumam disputar competições estaduais, regionais e nacionais, acumulando medalhas e troféus expostos com destaque no gabi- nete da prefeita.
“Os atletas, quando se fala que é surfe em Baía Formosa, se mo- bilizam no país todo”, acentua o secretário de Esportes Fernando Cardoso. “Isso fomenta o desen- volvimento da cidade, fazendo com que o surfe seja um esporte turístico, porque acaba trazen- do visitantes e a cidade só ganha com isso.” Além de promover suas próprias competições, o municí- pio sedia também etapas do Nor- te-Nordeste e da vizinha Paraíba. Um evento recente tinha cerca de 250 inscritos, comprovando a força social e econômica do es- porte.
Fernando Cardoso
OUTRAS ONDAS
Além do esporte, da histó- ria e da cultura, Baía Formosa apoia a expansão do turismo em um quarto pilar: a natureza. O binômio tradicional sol-mar foi enriquecido pela inclusão de outros lugares e atrações no roteiro turístico municipal, como a Mata Estrela, que se impõe na paisagem por ser remanescente da floresta que recobria o litoral brasileiro. Transformada em Re- serva do Patrimônio Particular Natural pela usina Vale Verde, a mata abriga lagoas e trilhas que atraem muitos visitantes.
“Baía agraciada por Deus”, diz a secretária de Turismo, Meio Ambiente e Defesa Civil, Maria Bernadete de Souza Leite Costa. “Não temos só o turismo de sol e mar. Temos várias lagoas; a maior reserva de Mata Atlântica sobre dunas e que é também um campo de estudos e pesquisas; a tirolesa no rio Guaju; e temos a nossa área mais bela, o pôr do sol da praça dos Golfinhos. A nossa cidade é considerada uma das mais preservadas justamente porque o turismo está ligado à preservação do meio ambiente. Não é fácil, mas a gente preserva. Se não tiver a conservação, o turista que vem aqui não volta”.
Da Baía dos Golfinhos, na área urbana, à foz do Guaju, na divisa com a Paraíba, Baía Formosa tem 27 quilômetros de praias, servindo de local de desova para tartarugas. A praia mais famosa é a do Sagi, que é uma espécie de polo turístico autônomo. O distrito reúne cerca de 30 empreendimentos e mais de 200 pessoas trabalhando em atividades asso- ciadas ao turismo – pousadas, bares e restaurantes, artesanato e pesca, passeios de bugue, quadriciclo ou barco. Apesar de tanta atividade, Sagi e a própria Baía Formosa ainda preservam o estilo e o clima tranquilos, que os gestores desejam perpetuar no tempo.
“A cidade está crescendo muito, mas ainda tem como característica esta parte de tranquilidade. Não vejo Baía Formosa como uma Pipa, nem queremos isso, porque junto com o turismo vêm também outras situações indesejáveis.
Acredito que o nosso crescimento não será tão rápido. Muitas vezes o empreendedor vem e acha que pode tudo, e não pode. Tem muita regra ambiental, mas é uma cidade que tende a crescer. Se comparar com 10, 15 anos atrás, a gente vê essa expansão, mas continua a ter as características de uma cidade tranquila. Isso é muito bom”, afirma a secretária de Turismo.
CALENDÁRIO ANUAL DE EVENTOS
BF Reveillon
31 de dezembro Praia de Bacopari
Emancipação política
Dezembro e janeiro
Vários eventos
BF Gospel
Música e cultura gospel
Janeiro
BF Folia
Carnaval
Fevereiro ou março
BF Pedro
Festa de São Pedro
29 de junho
Nas Redes da História
Auto da Resistência e outras atividades culturais
Agosto
Festa da Pituba
Setembro
Distrito da Pituba
Festa do Sagi
Outubro
Praia do Sagi
Sarau Literário
Novembro
Escolas municipais
N. S. da Conceição
Festa da padroeira
8 de dezembro
Festival de Cinema
Dezembro